domingo, 22 de novembro de 2009

A Noite e a Madrugada






Fernando Namora





Cansado de estar de cócoras em frente do bicho. A moleza do corpo não lhe permitia tal posição.
O sol viera adormecer os nervos, trazendo quebranto e desleixo aos músculos, como se um afago morno tivesse furado a cortina das nuvens para lhe vestir a carne friorenta com uma indolência entorpecente. Por isso os gestos do Pencas se espreguiçavam; por isso os seus membros eram vermes deliciados e o cérebro se esvaziava numa cálida zona de volúpia, todo ele sem forças para se interessar pela tortura da cobra. Esta, resignada ali na sua frente, fazia-lhe apetecer os dias rubros de soalheira, as vinhas, os baldios, os lagartos torrando-se no cimo das fragas, vida quente e livre, sem aquelas necessidades miseráveis de comida, botas, tabaco e vinho.

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