segunda-feira, 31 de maio de 2010

Poemas Escolhidos






Mário de Sá Carneiro








Anto

Caprichos de lilás, febres esguias,
Enlevos de Ópio - Íris-abandono...
Saudades de luar, tinbre de Outono,
Cristal de essências langues, fugidias...

O pajem débil das ternuras de cetim,
O friorento das ternuras magoadas,
O príncipe das Ilhas transtornadas -
Senhor feudal das Torres de marfim...

quinta-feira, 27 de maio de 2010

O Guardador de Rebanhos






Alberto Caeiro







I

Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planicie
E se senta a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Mensagem






Fernando Pessoa






Viriato

Se a alma que sente e faz conhece
Só porque lembra o que esqueceu,
Vivemos, a raça, porque houvesse
Memória em nós do instinto teu.

Nação porque reincarnaste,
Povo porque resuscitou
Ou tu, ou o de que eras a haste -
Assim se Portugal formou.

Teu ser é como aquella fria
Luz que precede a madrugada,
E é já o ir a haver o dia
Na manhã, confuso nada.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Nação Crioula







José Eduardo Agualusa






Carta a Madame de Jouarre

Luanda, Maio de 1868

Minha querida madrinha,
Desembarquei ontem em Luanda às coatas de dois marinheiros cabindanos. Atirado para a praia, molhado e humilhado, logo ali me assaltou o sentimento inquietante de que havia deixado para trás o próprio mundo. Respirei o ar quente e húmido, cheirando a frutas e a cana-de-açúcar, e pouco a pouco comecei a perceber um outro odor, mais subtil, melancólico, como o de um corpo em decomposição. (...)

terça-feira, 11 de maio de 2010

O País do Carnaval






Jorge Amado




Entre o azul do céu e o verde do mar, o navio ruma o verde-amarelo pátrio.
Três horas da tarde. Ar parado. Calor.
No tombadilho, entre franceses, ingleses, argentinos e ianques está todo o Brasil (Evoé, Carnaval!!).
Fazendeiros ricos de volta da Europa, onde correram igrejas e museus. Diplomatas a dar ideias de manequins de uma casa de modas masculinas... Políticos imbecis e gordos, suas magras e imbecis filhas e seus imbecis filhos doutores.
Lá no fundo, namorando o mistério das águas, uma francesa linda como as coisas caras, aventureira viajada, da qual se dizia conhecer todos os paises e todas as raças, o que equivale a dizer que conhecia toda a espécie de homem, tolera, com um sorriso condescendente, o galanteio juliodantesco de uma dúzia de filhos-família brasileiros e argentinos:
- A senhorita é linda...
(...)

terça-feira, 4 de maio de 2010

Formação Corporativa






Antonio Matoso e Antonino Henriques





"Esta disciplina destina-se, pois, a auxiliar a formação da consciência cívica dos alunos. Sem ela o programa educativo da escola profissional ficaria imcompleto.
O ensino há-de desenvolver-se em plano adequado à compreensão dos alunos, devendo o professor recorrer com frequência a analogias e exemplos extraídos da vida corrente, às mais salientes e conhecidas lições da história e ao confronto das realidades sociais e políticas portuguesas com as de outros povos contemporâneos, dominados por idiologias inconciliáveis com o espírito ocidental e cristão, raiz mais forte do corporativismo portugês."